terça-feira, 3 de maio de 2011

INTERVENÇÃO DA DEPUTADA ALINE GALLASCH-HALL SOBRE A INFORMAÇÃO ESCRITA DO PRESIDENTE DA C.M.L. ACERCA DA ACTIVIDADE MUNICIPAL

Lisboa 3 de maio de 2011

O PPM fica perplexo com a aura de auto-elogio das informações escritas do Sr Presidente da Câmara. A Reforma Administrativa, que é o verdadeiro assassinato sem escrúpulos do municipalismo, é visto como um acto heróico de grande feito e com aval científico. Esquece-se que nem sempre os estudos científicos e estatísticos servem bem as pessoas. Os munícipes precisam de um contacto mais próximo com os seus Presidentes de Junta, numa necessidade de identificação, confiança e aproximação tão necessárias ao seu bem-estar! E lá se foi mais uma tradição humanista portuguesa, a ser apagada das ruas e bairros de Lisboa, e o Sr Presidente congratula-se...

Congratula-se também com as obras do Pátio da Galé, mas, em nenhum momento, se preocupou em recuperar ou estudar o local na realidade. Sim, porque há vestígios arqueológicos do antigo Paço da Ribeira, da Casa da Índia e até da Ópera do Tejo! No entanto, isso é completamente ignorado ou até desconhecido. Mas o que importa isso ao Sr Presidente? Quer é abrir esplanadas padronizadas e descaracterizar ainda mais o município! Mais um pouco e o Pátio da Galé se transformará numa feira popular sofisticada. Já que gosta tanto de estudos científicos e de basear as suas opções nos mesmos, porque não manda fazer um levantamento dos vestígios arqueológicos desses monumentos emblemáticos que foram da cidade e que estarão lá incorporados? Poderia fazer dali um complexo museológico, recuperando verdadeiramente o passado dos lisboetas e perpetuando-o para o futuro. Quiçá até mudar para esse espaço o Museu da Cidade, que merece mais dignidade e importância, pois é o museu que conta a história de Lisboa, testemunha todos os seus momentos e teria toda a lógica em estar instalado nos edifícios recuperados do antigo Paço, destruído com o Terramoto.
E o que faz o Sr Presidente? Povoa o espaço com restaurantes de luxo com algo que ninguém sabe bem o que seja, isso da “comfort food”, como lhe chama, para Português algo como “comida confortável”, que deve é causar um desconforto enorme na carteira dos Portugueses... Ah, já me esquecia, aquela zona é mesmo só para turista ver... e consumir...
Ou seja, o que faz é supor que tudo o que é cosmopolita e bem polido, tem um ar de modernidade... como se as imagens estrangeiradas transportassem consigo um cunho ou uma sensação de qualidade. Na nossa apreciação, que peço de empréstimo a Fernando Pessoa, isso chama-se “provincianismo”.

Quanto aos vários Planos de Pormenor pensados para a cidade, chamo a atenção, em particular, para o Plano de Salvaguarda da Área Envolvente do Palácio da Ajuda. Desejamos mesmo que seja para salvaguardar aquele património, porque já chegou a destruição feita nos anos 50 do século XX de parte da Real Barraca. A zona que não ardeu no incêndio a 10 de Novembro de 1794 foi destruída em nome do progresso, para construir a linha do eléctrico. Peço-lhe que mantenha a parte da ruína das antigas cozinhas da Real Barraca, uma das poucas construções que subsistiram do arquitecto Giovanni Carlo Sicinio Galli Bibiena, autor dos teatros de ópera de D. José e do risco da igreja da Memória. Estas ruínas, cujos azulejos já quase desapareceram na totalidade porque nunca foram devidamente cuidados, (embora nos anos 90 do século XX ainda se encontrassem “in situ”), constituem das poucas referências que não foram apagadas pelo incêndio mencionado, pelo tempo ou pela ignorância. Pedimos-lhe que preserve esse património na sua totalidade. E sim, é bom que faça um remate decente à fachada Poente do Palácio, que é uma vergonha. Não sei se sabe, Sr Presidente, mas habitualmente, chamam àquela fachada que está inacabada, esburacada, em péssimo estado, a fachada da República, em contraponto com a principal, que é a fachada da Monarquia. Magnânima, sólida, imponente, que transmite segurança, força e confiança, enquanto a fachada da República é aquela desgraça a desfazer-se, um pouco como vemos o regime actualmente. Em 37 anos, 3 vezes na bancarrota, é algo nunca visto na História de Portugal! E, curiosamente, sempre pelas mãos do PS. Parece que não têm amor nem consideração pelo país e pelos portugueses, só se preocupam com o poder e o dinheiro de forma gananciosa. A República deixou o país na miséria, agora nas mãos de entidades exteriores para sobreviver. Não para se desenvolver, repito, PARA SOBREVIVER. Foi para isso que mataram o rei, o príncipe herdeiro e deram um golpe de Estado completamente anti-democrático? Foi para isso que impuseram uma República que está completamente podre? Se era o caos que desejavam instalar no país, parabéns, conseguiram-no!
Com certeza o Sr Presidente vê agora uma boa oportunidade de mascarar a fachada republicana presente no lado Oeste do Palácio da Ajuda. Mas se tem de o fazer, então faça-o com dignidade, e preservando os vestígios arquitectónicos. É o mínimo que um Presidente da Câmara consciente pode fazer com um edifício tão importante da cidade e da História de Portugal.

E por falar em actos que deveriam ser conscientes, eis que vemos o nosso Presidente da Câmara, qual herói de banda-desenhada, capa e espada, ou só capa (de preferência cor-de-rosa), voando dos Paços do Concelho para... o Intendente. Benemérito, dá-se ao luxo de dispender 5.600€ de renda mensais, por 10 anos, quando tem o edifício dos Paços do Concelho completamente à disposição, mantendo-o apenas para “reuniõezinhas”. O que equivale a 672 mil euros de um gasto completamente supérfluo, desnecessário, que não intervém positivamente em nada na zona. Pelo contrário: já tínhamos dificuldades em ter mais residentes em Lisboa, devido à sua mudança essa dificuldade acentuou-se! Os prédios na zona aumentaram as rendas para o dobro! Deve ser para verem os seus lindos olhos, Sr Presidente. Pois foi isso que conseguiu com a mudança de instalações – inflaccionar preços de arrendamento, gastou sem dó dinheiro dos contribuintes, sem contabilizar ainda os gastos para instalar devidamente os serviços! Imagine-se o que não virá por aí!
Esses 672 mil euros não correspondem a nenhum investimento para reabilitar um edifício ou alguma estrutura no Intendente: é um gasto caprichoso só para pagar uma renda. Quando o Sr já tem uma casa, que lhe foi atribuída! Queria mudar-se, pagava do seu bolso e não com dinheiro dos munícipes! Os mesmos munícipes, Sr Presidente, que votaram em si para governar e orientar a cidade, e não para esbanjar o dinheiro deles com rendas absurdas, pagas por uma década, quando o Sr foi eleito apenas por 4 anos! Isso é abuso de poder! Isso é esbanjamento irresponsável do dinheiro do município! Isso é total irresponsabilidade e demagogia; é ser-se leviano com o dinheiro dos outros! Não foi para isso, definitivamente, que votaram em si.
Esta é a típica acção demagógica própria do PS: lembram-se de um caso semelhante, na cidade do Porto? Pois o PPM lembra-se na perfeição. O Sr Dr Nuno Cardoso achou por bem deslocar o centro camarário para a zona da Sé, uma parte muito degradada dos bairros históricos do Porto. Resultado: a zona continuou degradada, apesar de ter gasto dinheiro a “maquilhá-la” e continua a ser perigosamente (in)transitável, mesmo de dia.
Pois não queremos maquilhagem em Lisboa nem demagogia gratuita, Sr Presidente. Muito menos despesas supérfluas, vergonhosa e despudoradamente gastas nas suas deslocações para o Intendente. Por acaso o Sr vai lá ficar a dormir? Ou é só para passear de dia? Ou julga que a sua omnipresença é suficiente para melhorar toda aquela zona? Isso é ter-se em alta conta, não há dúvida!
O Sr Presidente diz-se ateu, mas quer-nos parecer que é exactamente ao contrário. Parece-me profundamente religioso. Inspira-se em Deus, julgando-se acima do juízo dos homens, e que as suas acções são perfeitas e imaculadas. Não é, Sr Presidente, não é Deus, nem pode ter pretensões de o ser. Não é omnipresente, pois à noite o Intendente vai continuar a ter os problemas que sempre teve, e nem a sua aura quase divina, emanando da antiga fábrica da Viúva Lamego e com a sua simbologia algo maçónica, poderá acabar com a criminalidade e os problemas sociais graves que ali se passam.
Julga-se, talvez, o Intendente Pina Manique do século XXI. Mas para isso, Sr Presidente, precisava de estar em outra categoria...
Só peço humildemente desculpa por uma referência que fiz, há meses atrás, sobre si, Sr Presidente. Afinal, não será à frente da Câmara Municipal que irão erguer-lhe uma estátua. Pelos vistos, será no Intendente ou, quiçá, será o Sr a própria inspiração à nova estátua da República, na Avenida do mesmo nome, concretizando a simbólica que, actualmente, é própria a esta República Portuguesa: pura demagogia, exaustiva retórica, deslumbrante espectáculo, total esbanjamento, absoluta indiferença social, entre outras tantas posições... Aconselhamos um livro, para inspiração na realização dessa obra-prima da estatuária portuguesa, que irá nascer para comemorar os 100 anos a cavar a cova de Portugal. Iconograficamente, poderá recorrer a Cesare Ripa. Sempre é melhor e mais digno que figuras de mulheres com ares badalhocos e barretes na cabeça...

Quase a terminar, uma palavra quanto à ecologia e espaços verdes – os espaços quase inexistentes da nossa cidade.
Refiro-me à Cerimónia de Comemorações do dia Mundial da Floresta. Para festas, o Sr Presidente está sempre pronto. Mas para plantar árvores e fazer uma proposta ecológica verdadeiramente revolucionária para a cidade de Lisboa, isso deixa para o Sr Vereador Sá Fernandes. Que também, não faz nada, a não ser andar de bicicleta. Ou melhor, mandar fazer pistas para bicicletas. Porque ninguém nunca o viu em cima de uma. Até desconfiamos no PPM que o Sr Vereador Sá Fernandes não sabe andar de bicicleta, apenas sonha à noite, ardentemente, em andar nelas, daí a sua obsessão por tantas ciclovias. Como diz o líder do meu grupo municipal, não é o vereador dos espaços verdes, mas dos espaços vermelhos – a cor dessas ciclovias!

Só posso concluir que o Sr Presidente é uma vítima, uma vítima do sistema; participa, sem perceber bem, na ruína do país. O Sr Presidente é a verdadeira figura da tragédia grega, ou seja, está mais próximo de uma personagem de Sófocles, do que de Aristófanes; limita-se a fazer o que os outros fazem – negócios cujas motivações são pouco claras e os lucros ao povo, nenhuns. Tudo numa grande tragédia à portuguesa que o nosso país, e a cidade em particular, se tornou.
Saúdinha, Sr Presidente, e que viva muitos anos para ver bem o que anda a fazer e passar a reformar convenientemente, o que é a sua obrigação. Falar menos, fazer mais, gastar menos, poupar mais. Isto beneficiaria a cidade em muito maior grau que as suas deslocações e mudanças de instalações desnecessárias.
È que todos nós somos responsáveis pelos nossos actos. Não só no imediato, mas principalmente para com as gerações vindouras, que nos julgarão. E que irão escolher se se orgulharão de nós ou se terão vergonha. E, de facto, actualmente os motivos de orgulho são muito poucos. Isso, sim, é a maior tragédia.