terça-feira, 2 de março de 2010

Intervenção da Deputada Aline Gallasch-Hall - Assembleia Municipal 3 de Março de 2010

Exma. Senhora Presidente da Assembleia,
Exmos Senhores Secretários da Mesa da Assembleia,
Exmo. Senhor Presidente da Câmara,
Exmos Senhores Vereadores,
Exmos Senhores Deputados,


Foi com o maior deleite que lemos a informação escrita do Sr Presidente da Câmara e queremos, desde já, aqui louvar as suas magníficas intenções no, e passo a citar, “reforço da proximidade, da eficiência, do rigor, da participação e da transparência” como constituintes da “prioridade deste Executivo”. O brilho da ideia é evidente. Ficámos logo mais confiantes na restante leitura, demonstrativa que é, obviamente, das suas acções.
Fala na constituição de uma Equipa de Missão com o intuito de reorganizar os serviços da Câmara. Não poderíamos estar mais de acordo consigo;
Porém, perguntamo-nos a partir de quando e com que periodicidade irá informar esta Assembleia sobre a evolução dos trabalhos ou se, eventualmente, informará apenas quando for altura de mostrar resultados, no termo cronológico estipulado, ou seja, em Dezembro de 2010? Esta é a nossa primeira questão.
Outra reporta-se, como já deverá esperar, às comemorações dos supostos 100 anos da República Portuguesa. Digo “supostos” porque, pelos vistos, irão dar vivas às Ditaduras que o nosso país sofreu e, quiçá, louvar os seus responsáveis ou, até, quem sabe, os assassinos d’El Rei D. Carlos e o Príncipe herdeiro...Confesso que não é essa a ideia que o PPM faz de democracia. No entanto, parece ser um ponto de vista que, embora em desacordo, respeitamos.
Contudo,
Devo salientar que andam mal informados e com imprecisões históricas graves. Nomeadamente quando, no protocolo que aprovaram na sessão de Câmara de 23 de Dezembro de 2009 e assinado no passado dia 14 de Janeiro com a Comissão Nacional para as Comemorações da República em Portugal, afirmam, no 4º parágrafo, que um dos ideários republicanos era o municipalismo, como “princípio constitutivo da descentralização administrativa, de que Lisboa é um protagonista essencial”. Ora, não só quem escreveu e assinou isto não percebe nada de História, como ainda por cima deve estar a falar de uma Lisboa que não é a nossa.... Descentralização? Pois se Lisboa está a ser protagonista de um verdadeiro celeuma de “centralização” de interesses, não muito bem esclarecidos, que é a questão do Red Bull Air Race? Mas já lá iremos...
Deveremos informá-lo, Sr Presidente, que o municipalismo nasceu com as cartas de foral concedidas, desde o primeiro rei de Portugal que, caso não saiba, datam do século XII, e não XX. Chama-se a isto “anacronismo”. Dou-lhe já o exemplo da 1ª carta, concedida ainda era Condado Portucalense, por D. Teresa, o foral do Porto, ao Bispo D. Hugo. Esse municipalismo ficou administrativa e politicamente mais organizado e desenvolvido no século XVI, com D. Manuel I. Em Lisboa, com D. João V, a separação de Lisboa Oriental da Lisboa Ocidental não terá sido de somenos importância... Caso também não saiba, a Constituição de 1822 propõe e concretiza uma reforma administrativa louvável, autonomizando as Câmaras Municipais com a criação dos distritos, entre outras medidas. Na senda do liberalismo, foram reconhecidos 796 concelhos só no ano de 1833, em plena Guerra Civil. E ainda tem coragem de dizer que o municipalismo é uma prerrogativa republicana? Sabia que, em vários períodos da nossa história, o povo escolhia os seus administradores locais, de entre os homens bons?
Para mais informações, consulte o Dicionário da História de Portugal, Dir. Joel Serrão, capítulo sobre a Organização Administrativa Local – a bibliografia é imensa, se quiser poderei facultar-lhe, com todo o gosto, mas este é de consulta rápida...
Voltando ao protocolo, quando no ponto 1.1., sobre a Cidadania, falam em “promover as minorias”, também inclui aqui os monárquicos, já que os consideram uma minoria? Terão eles direito a dar o seu ponto de vista, ou serão silenciados? No âmbito do ponto 1.3., dito de “Intervenção Urbanística”, irão renomear ruas de Lisboa com toponímia ligada à República...porquê? Já não lhes bastaram as ruas a que tiraram o nome original, como a Rua da Princesa (actual Rua da Prata) ou a Avenida Dona Amélia (actual Almirante Reis), só para citar alguns exemplos?
Quando fala dos “valores da cidadania numa sociedade democrática”, citação do ponto 2., próprias do regime republicano, está a falar de que valores? Os da ditadura salazarista? Os da ditadura militar? Quais são esses valores que serão exaltados? É porque, se bem me parece, a “sociedade democrática”, como lhe chama, são uns parcos 35 anos...e não 100...
Mas como ao longo dos últimos tempos tivemos bons exemplos de que o Partido Socialista tem alguma dificuldade em fazer contas, provavelmente este será outro desses erros...
No ponto 3.1.7., quando visa a cedência de espaços para exposições, debates e conferências, também vai deixar espaço para o ponto de vista dos monárquicos, ou cingir-se-á a uma propaganda republicana pura e simples? Aliás, em alguns casos, propaganda enganosa, como a mencionada questão do municipalismo.
Curiosamente, em nenhum ponto do protocolo existe informação sobre questões orçamentais. Mas comemorações custam dinheiro, como aliás, já foi publicitado pelo Governo com os famosos 10 milhões de Euros. Soubemos, no entanto, pela Exm.a Sr.a Vereadora Maria João Mendes que o orçamento ronda os 300 mil euros. Não têm onde gastar o dinheiro, Sr Presidente, e vão esbanjá-lo em comemorações???? Não seria melhor injectar esse dinheiro em assuntos mais prementes? Relembro-lhe os 1117 prédios em risco de ruírem, e os 4 que já ruíram a semana passada…
Impõe-se a pergunta, Sr Presidente, que consideramos legítima:
Não acha que deveria dar conhecimento à Assembleia Municipal desse programa e seus custos discriminados? É uma questão de organização, método, ou é este o seu conceito de “eficiência, rigor participação e transparência”, que falava no seu discurso?
Devo ainda lembrar-lhe que, uma das argumentações mais fortes da República contra a Monarquia prendia-se com as somas despendidas pela última em festas. Não acha que a República está a fazer ainda pior? Num tempo de crise profunda, que Portugueses não têm emprego, não têm o que comer, festejar-se 100 anos que nem sequer são totalmente democráticos, não acha uma pouca-vergonha no estado actual do país?
E eis que surge no horizonte um aviãozinho...da Red Bull Air Race.
Sr Presidente, gostaria que me explicasse algumas coisas, porque todo este processo é por demais nebuloso e muito, mas mesmo, muuuuito pouco claro;
1 – Porque é que foi mudado o Red Bull do Porto para Lisboa? Quer ser Páris e o Red Bull é o pomo da discórdia? Já não tinha antagonismos e clivagens entre as duas cidades suficientes, precisava de mais um motivo? Se era um maior mal-estar entre as duas principais câmaras do país que queria, parabéns, conseguiu! E não desejo sequer supor que poderá ter sido uma questão política, pelo facto de a CM do Porto ter maioria PSD...não, isso nem passa pela minha cabeça, não será de todo uma questão política!
2 – O encargo da CML de 350 mil euros terá que tipo de retorno?
3 – Já há autorização da INAC? E quem a solicitou, a CML ou a Red Bull?
5 –Quais são as contrapartidas, financeiras, publicitárias ou outras, e as suas garantias? Há algum estudo nesse sentido? Onde está?
6 – Diz-se que a empresa OMNICOM se responsabiliza por 2, 5 milhões de euros dos 3, 5 milhões totais. Como poderemos confiar nisso, se não há vislumbre de nenhum contrato, nem de garantias bancárias por parte dessa empresa? Se falhar, a CML terá de comportar todo esse montante! Onde irá buscá-lo? Aos munícipes ou à Comissão para as Comemorações da República?

Por último:

Recordo-me da loucura no meio do Verão, no querido mês de Agosto, vésperas de eleições autárquicas, ser impossível andar por Lisboa. Ele era trabalhadores de madrugada a fazer obras, ele era limpezas nunca vistas nas ruas, ele era ciclovias para quem aprecia jogos sem fronteiras com obstáculos intransponíveis, desde quiosques no meio das ditas até ciclovias a acabar contra uma parede...um lufa-lufa nunca visto nos seus dois anos de mandato! E, agora, onde estão? Sonhos que sonhei, onde estão? Onde estará toda essa gente trabalhadora e incansável? Não quero acreditar, não, recuso essa ideia terminantemente. Não foi de todo para cativar o eleitorado...com certeza, estarão a descansar em algum spa, esgotadíssimos pelo trabalho intenso efectuado antes das eleições...
Pois é assim que vemos o bom trabalho: como não há ideias a pôr em prática, vai-se buscar o programa ao Porto; o resto, está esplanado em 17 páginas, letra 14, espaço 1, 5, com mais de 10 mil funcionários no activo...
Resta-nos parabenizá-lo pelo, como diz no seu discurso, “reforço da proximidade, da eficiência, do rigor, da participação e da transparência...”
Obrigada.

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